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Set19
VICTOR OLIVEIRA MATEUS - DUAS FOTOGRAFIAS
Uma fila de meninos na linha d’água.
Uma onda deixou-lhes à volta dos pés
um enrugamento de reflexos.
Parecem felizes. Ousados mesmo!
Apenas um, o segundo a contar da direita,
prende o meu olhar: parece-me assustado,
frágil, as mãos – cruzadas à frente - seguram algo
que não identifico, enquanto os cabelos,
luminosos, não lhe disfarçam o esgar do medo.
A outra é posterior (talvez uns 15 anos depois):
parte de uma cabeça debruçada sobre uma cidade
do sul da Europa, contudo, reconheço os olhos,
os mesmos daquele menino, que, um dia,
se começou a perder numa praia qualquer,
perante a indiferença do mundo e a inépcia
dos seus. Os olhos, agora baços e virados para dentro,
estão quase mortos, entre uma barba de 2 dias
e um boné de marca, como convém àquela idade.
Que teria acontecido entre a primeira
e a segunda fotografia? Em que local
se avolumou o desacerto? Quem não acudiu
àquela ferida: pungente, extrema?
Perguntas que hoje me adensam a culpa,
aqui, bem no centro do poema.