08
Set20
NOEMI ALFIERI - ESTAÇÕES ÍNTIMAS
I - Outono
Folhas secas estalando entre as solas e a calçada
comprimem os sonhos de entranhas feridas
que sangram
sangram pelo tempo que fugiu
magoadas
agarram-se ao estômago libertando borboletas
na garganta
flores murchas esperam por ser polinizadas
Florescem
os sonhos da criança que não fui.
II – Inverno
A pele rasgada descompondo-se
no canto dos pássaros ignaros, celebrando a vida.
O frio a entrar
mais uma vez pelos ossos adentro
frágeis como açúcar roíam
os meus ossos,
roíam.
O ruido ensurdecedor do silêncio
embatendo no vento que o tempo parou
prendeu as vísceras
estrangulou o amor
tentou matar a humanidade
Falhou.
III – Primavera
Cuidei de ti
silenciando este corpo de mulher
esmagando estes sonhos lindos
tapei asas ansiosas por dar a volta ao mundo
calei desejos de revolução
morri.
Ressurgindo com as minhas ancestrais
floresço de novo
nesta enésima primavera.
IV - Verão
Agora que o tempo acabou e
o teu rosto se desintegra perante os meus olhos incrédulos,
fogem palavras
trocadas nas noites mais longas de sempre
A água salgada corre o meu vulto,
dos sulcos rastos de sangue surgindo evocam
cicatrizes antigas nunca saradas
Abre-se ao mundo a minha carne.
Ferida mas sobrevivente
aqui estou
o tempo não me venceu ainda e
a tua negação não vai conseguir matar-me.