Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

GAZETA DE POESIA INÉDITA

Espaço dedicado à divulgação de poesia original e inédita em língua portuguesa.

GAZETA DE POESIA INÉDITA

15
Ago20

ELISABETE MARQUES - A TORRENTE

                    A torrente levou tanta terra e pedras
que teve de mudar de sítio
Leonardo da Vinci


I


ela vem
arrebatada
a grande
quantidade
do que cai
ou jorra

rumorejo crepitoso
repentino cavalo
de ritmo irregular

água da montanha
escorrendo
em leito pedregoso
cascalho cascata
caldo obscuro
feito de ângulos

crina farta
aprende-se
com ela
as coisas
sucessivas
arrastadas
na inclinação
árdua

palavra enxurrada
o álveo aberto no declive
ímpeto do exemplo
rompendo pulsante
vindo ela vem

II

nem vertical
nem horizontal
oblíquo rasgo
espuma-se
e sombrio galga
a pedra aguda
da rua
assim borbulha
o depósito mineral

e percorre
a via
tortuosa
da encosta
maré quebrada

ela chega
ela impõe
as suas pratas
de água
em andamento

a grande boca
da abundância
por onde sai
um murmúrio
violento

volteja
em turba ravina
desarranjada
no seu curso
sofrível
o sobressalto
do sedimento

III

assonante
cacofónica
padece do mal
da fusão sonora
por excesso

segue a linha
um voo raso
de aliterado
executa

pedras palavras
páginas pepitas
perdas princípios
pontos pulsares
pasmos palpites
peça partícula
pausa partir

tumulto
trânsito
transtorno
transbordo

trepidação voraz
a desmedida
enchente estala

do sulco feito
pelo arado
saltam faúlhas
arrefecidas

telinta tintina
sinuosidade
do grânulo sujo
onde a boca
tropeça certa

IV

mudar-se-á
a paisagem
mudar-se-á
o povoado
mudar-se-á
a palavra

terra carregada

vindo vem trôpega
transvertendo
transferindo
transmutando

interrompida
momentaneamente
por rochas e raízes

e hásteas perdidas
compelindo o ressalto

porque em catadupa
marulhosa pelo córrego
a ribeirada
salpica os ares
por colisão
com as rasteiras

intermitências
respingos rítmicos
lavrando o logro
na liga do lodo
e do calhau

a tumultuosa
rompe estrebucha
dribla dilacera
também pela pedra
do terreno percalço
que rasga a gorja
plana da água

V

da compacta
massa
declina-se
o revérbero
argentado

escutada longe
a sua insensata
passada cadente

desmancha-se
para acontecer
conforme
a morfologia
do solo que engole
e que reversa
ou devolve
dúctil

ela enrola-se
confunde-se
com o resíduo
rainha carregada
de quartzo

o temor
em ziguezague
a sonoridade
do vórtice
importa

vinda vem
a torrente

abrupta

 

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2021
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2020
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2019
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2018
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D

Mais sobre mim