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Fev20
EMANUEL MADALENA - "PEÇO UM TERRITÓRIO..."
Peço um território inculto sem lápide
ou marcação, talvez um poema-mortalha
que me abrigasse a nudez enterrada numa rotunda
de estrada nacional, pois basta a orla
de um vestido descido sobre a morte e somos
guerra, lonjura de erva daninha, e basta
um medo encolhido nos ossos, capataz fúria
de um anteparo cego estendido sobre o silêncio,
poemário de lava que me acenda o cadáver,
fogo fátuo de todos os líquidos, e somos cinzas
presas na garganta da mãe, ou espalhadas
como sangue morno na pele fria do mármore,
pois hei-de lamber o ferro e provar as feridas
abertas com o papel das velhas cartas, e conhecerei
apenas a falta de um mar que me lembre o seu suor,
apenas a falta de um corpo, e viverei para sempre
sem casa, fugido das palavras, como se fosse
a exacta e contígua casca de outro homem.