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Out20
JOSÉ LUÍS BORGES DE ALMEIDA - A PALAVRA QUE FALTAVA
eu quero apenas a palavra que ainda ninguém disse,
selvagem e indomável, isenta de voz e ausente da sua
ária, omissa nos cânticos, negligente e sem memória.
eu quero a palavra toda, capaz de descrever o nada e
o tudo que sinto quando a leio, que após ser escrita
nos obriga a imaginar que não sobram outras letras,
indecifrável nos dicionários, inaudita nos silêncios.
eu quero a palavra imprevisível que ninguém espera,
que lida hoje não será a mesma amanhã, que troca as
letras para me enganar permanentemente. eu quero a
palavra impossível, com cinco is como impingiríeis ou
inimicíssimo, nascida de horas sombrias que aprendeu
a combater sem cicatrizes visíveis. eu quero a palavra e
o seu oposto, a palavra sem rosto, a última que faltava
para completar o poema, sem o conseguir na verdade.