03
Nov20
MARIA JORGETE TEIXEIRA - NATAL
Uma jovem mulher pariu um filho
numa rua de Lisboa
Isso se sabe.
Abriu as pernas e deixou passar
o filho como um rio
Na madrugada fria
Nada mais aconteceu.
Nenhum grito furou os vidros duplos dos prédios
ninguém se inquietou
a colher não se deteve antes de chegar à boca
o açúcar do café não amargou
nem os lábios ficaram a meio do beijo
Toda a gente dormiu em paz!
Uma jovem mulher pariu um filho
numa rua de Lisboa
Mas não lhe contou os dedos,
não viu a cor do cabelo
não soube o cheiro da pele
não o aconchegou ao seio.
No dia seguinte acordaram
as vozes dos que nada tinham visto
nem ouvido nessa noite ácida.
Era preciso indignarem-se
para continuarem a dormir sossegados